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III A sorte

Sexta-feira, 29.06.12

Muito se tem falado dela, a propósito do que se passou antes e depois de Donetsk. Em relação à sorte…


 

não se conhece receita

já tem dado jackpot

passagem

pontos

há a de principiante

a do jogo

há quem tenha muita

a dos campeões é uma estrelinha

diz-se que favorece os audazes

às vezes é supersticiosa:

alguns apostam sempre nos mesmos números

outros batem na madeira

cruzes canhoto

por vezes é pouca

às vezes falta uma pontinha

é inexplicável

há que fazer por ela

em certas alturas é madrasta

nem sempre se pode contar com ela

desconhecemos quando surge o seu auxílio

ou quando irá terminar

nem sempre aparece

nem se sabe quando isso irá suceder

faz a diferença

não é para todos:

nuns casos manda à barra, noutros ajuda a entrar

dizem que azar no jogo, sorte no amor

nem sempre é merecida

às vezes aparece no último instante

outras vai contra a corrente

em relação à sorte, ela também conta

mas, no que respeita a penáltis, nem é bom falar nisso

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publicado por Carlos M. J. Alves às 10:00

III Porque no se callan?

Quinta-feira, 28.06.12

Sim, perdemos. Ficámos a 90 minutos de Kiev. Travados pelos penáltis. Na lotaria calhou-nos jogo branco. Não saiu o nosso número da sorte.

Caímos. Como uma grande equipa. É unânime.

“Campeões de quê?”, perguntamo-nos em relação à Espanha.  

Festejem, mas baixinho. Sem exuberâncias. Eramos para ser nós!

Mas, não vamos estar na final.

Acordámos com um gosto amargo. A precisar de confirmar o resultado. Um mal-estar generalizado.

   Tal como ameacei estou de trombas. Vou andar amuado durante semanas. A compostura foi-se. Tenho vontade de armar barraca. Não consigo estar calado.

Mas, por mim mal terminasse a final do Euro 2012 começávamos, imediatamente, outro Campeonato da Europa.

Apesar de o Euro 2012 ter tido para nós manigâncias de “quase”. Não é mau. Alturas houve em que nos ficámos pelo “Já está?”. Participação de “toca e foge”. Esses dias ficaram, felizmente, para trás.

   Fizemos boa figura. Há sentimento de missão cumprida. Também somos bons. Começámos mal e com polémicas, mas melhorámos de jogo para jogo. Fomos inteligentes. Organizados. Houve união. E entreajuda. Paulo Bento pegou num grupo de talentos individuais e transformou-o num colectivo unido, em espírito amigos para siempre. De um balneário desunido para uma turma de adolescentes endiabrados acabados de chegar de uma viagem de fim de curso inesquecível.

   Pusemo-nos a jeito para sermos campeões. Ninguém tem dúvidas. Mas, acabámos na trave em Donetsk. Azar?

   O Euro nunca devia de acabar. De 2012, passava a 2013, depois a catorze. Dígitos substituindo dígitos. Prazos adulterados. Contabilidade corrompida.

Por mim mal terminasse o Euro 2012 começava, automaticamente, outro.

Com o Euro a gente esquece-se. Andamos mais animados. Orgulhosos. Auto-estima em alta. O hino arrepia-nos. Portugal é uma coisa boa. Dez milhões de talentos. O segredo mais bem guardado da Europa.

Com o Euro andamos cá por cima. Ultrapassamos a Inglaterra, França. Fazemos tombar a Holanda e a Dinamarca. O Euro põe-nos no topo do mundo.

Somos da malta. Andamos lá pela frente. Favoritos. Temíveis. Pomos em sentido os suspeitos do costume.

Também temos equipamentos bonitos. Autocarros à maneira. Somos populares. Todos nos querem para a fotografia. Não nos faltam namoradas.

Têm medo de nós. Ameaçamo-los com Ronaldo e eles tremem. As estatísticas não nos intimidam. Défice só existe o de tempo suficiente para marcar mais. Dizem bem de nós. E acham que nós somos a considerar.

Quando o Euro acabar voltamos ao lugar habitual. Lá para trás. Metas para cumprir. Austeridade. Taxas. Impostos. Voltarão a ser palavras de ordem.

Esquecemos os lances duvidosos. Os remates. Os cruzamentos. Os livres. As defesas impossíveis.

Voltaremos a andar aflitos. Sem esperança. Fartos. Pobrezinhos. Saturados da conversa do costume. As tristezas até parece que ajudam a pagar as dívidas.

   Mas deixemos isso para depois. Para quando tiver que ser. Hoje, ainda, é dia de rescaldo.

   Outro Euro, se faz favor. Mas sem penáltis.

 

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publicado por Carlos M. J. Alves às 09:13

III Se nos der a vitória, “A mi me dá igual”

Quarta-feira, 27.06.12

Em relação ao Portugal-Espanha, aviso que não me importo que não ganhe o melhor. Desde que vençamos: A mi me dá igual.

Vou fechar os olhos se formos nós a triunfar sem merecer. Facilito. Impressionar não traz vantagens.

Não precisa de ser bonito.

Até pode ser por sorte.

Lance fortuito.

Azares inexplicáveis.

Favorecimento.

Por compaixão de nuestros  hermanos.

   Vou ser claramente tendencioso. Mal marquemos termina.  Desrespeito tempos regulamentares.

   Por mim, meio golo dá-nos a vitória. As [nossas] intenções contam.

   Vivo bem com o “não mereciam”. Com o “como é possível?”, incrédulo. Não vou dar o braço a torcer.

   Também não me importo se não jogarmos bem. Até posso olhar para o lado. Atabalhoado serve perfeitamente. Desde que entre. Directamente, às três tabelas ou de raspão. É preciso é perceber-se. Uma dúvida ou outra, também, se desculpa. Subentendido não é roubado.

   Se o pior acontecer não vou ter bom perder. Ficarei de trombas. Andarei amuado semanas. Perderei a compostura. Armarei barraca.

   É bom que ganhemos senão ninguém me atura. Difícil será calar-me. É melhor para toda a gente. Fica o aviso. Se é para perder nem vale a pena aparecer.

   Não quero saídas de cabeça erguida. Não quero ser uma grande equipa, quero ser a que ganhou. Troco duas vitórias morais por um triunfo à rasca.

   Já que fizemos a despesa quero a taça. Menos que a vitória é mau resultado.

   Não desejo mal a ninguém, mas em relação aos espanhóis…

   Depois falamos!

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publicado por Carlos M. J. Alves às 10:53

III Isto de ser pai...

Segunda-feira, 25.06.12

Isto de ser pai dava emprego a pelo menos mais três pessoas. Consome tempo e mão-de-obra suficientes. É uma canseira. Acrescenta rugas. Prodigaliza cabelos brancos.

Toda a gente quer ser o melhor. Fazer o máximo. Cortar a meta em primeiro lugar. Mas, temos sempre a sensação de andar com uma volta de atraso em relação ao exigido.

Não há aquecimento prévio. Ou treino. Nenhum sítio para aprender o bê-á-bá.

Dispara-se às cegas. E em todas as direcções.

   Lamentamos os nossos erros (diferentes, novos) e os do nosso pai (que jurámos nunca cometer), que nos podia servir de exemplo. Mas, se há ocasião em que a história se repete é na paternidade.

   Percebo agora porque os caminhos entre mim e o meu pai tantas vezes se descruzaram. Sem culpas a atribuir. Ele sendo pai e eu comprometido com a minha parte (de filho). Cumprindo-a. Escrupulosamente.

   Isto de ser pai facilmente baralha. E dá de novo. Uma vez o processo iniciado, não dá para não ir a jogo. Ninguém perdoa renúncias.

   Há tantas opiniões de como sê-lo, quanto o número de pais. Desacordo geral. De quem lamente ao ponto de estar convencido tratar-se de uma overdose sem as partes fixes associadas a uma vida de rock star. A uma experiência mística.

A minha opinião? Algures entre ambas. Às vezes não se sabe. Se dói. Se fique, se vá. Se grite, se chore. Outras, enganamo-nos. Exige procurar conselhos, quando os há. E inventa-se pelo meio.

Em certas ocasiões aprendemos com os erros. Mas, nada é garantido.

Resmungamos.

Duvidamos.

   Isto de ser pai tira-nos do sério. Troca-nos as voltas. Desconcerta.

Oprime. Nenhum lugar é seguro. Nada é sagrado. Em constante estado de sítio.

Constrange.

É um abuso. Desarruma-nos a casa e parte-nos a loiça. Toda. Os pratos de estimação são os primeiros.

Baba-nos.

Lixa-nos. Violenta-nos.

Obriga-nos a tudo.

Dá-nos umas merdas de umas noites. Uma porra de umas férias.

Vontades de...

Rebenta-nos com a vida social. Transforma-nos em bichos-do-mato.

Atrapalha-nos a libido. Seres assexuados. Arrependidos do pecado original. Pagando por ele.

Quando pensávamos que já estava...

Fugir nunca é a solução. É pena! Nem isso.

   Isto de ser pai é para acabar de vez com o nosso egoísmo. É de darmos a vida.

Se a gente pensasse bem…

Se estivéssemos atentos ao que fizemos ao nosso…

   É a paga de sermos filhos. Com juros.

De ter partido a cabeça naquele sítio. Perigoso.

Termos faltado com o prometido.

Escapado ao castigo.

Falhado com o trabalho final.

Atrasados para o compromisso importantíssimo.

Escolhido aquela namorada, com visual trash de Courtney Love. Recebida de dentes cerrados com um: «muito prazer».

Festejado até àquela hora. Sem telefonar.

Ficarmos parvos na adolescência.

   Isto de ser pai é estar sempre a aprender. É para toda a vida. E não se muda de campo.

É inexplicável.

Dá-nos a certeza de que tudo vale a pena.

Não tem preço.

É de não haver nada de mais importante.

É coisa para não trocar por nada.

Só passando por isso.

Recomendo.

   Isto de ser pai é, afinal, o melhor que nos podia acontecer.

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publicado por Carlos M. J. Alves às 18:17

III O Senhor do Adeus

Domingo, 24.06.12

Como hoje é Domingo lembrei-me de João Manuel Serra (JMS). É uma razão como outra qualquer. Válida q.b..

Podia ter acabado de ouvir o fado O Homem do Saldanha, interpretado pelo Marco Rodrigues composto em sua honra.

Ou revisto as suas participações especiais no filme de zombies I'll See You In My Dreams ou na série de televisão O Mundo Catita.

Ou a sua aparição na banda desenhada As Aventuras de Dog Mendonça e Pizzaboy, de Filipe Melo e Juan Cavia.

Mas foi, mesmo, por hoje ser Domingo que me recordei dele. Como era amante de cinema, todos os domingos assistia a um filme, na companhia de Filipe Melo, músico de jazz, realizador de cinema e argumentista de BD e Tiago Carvalho. Durante cerca de sete anos. Os comentários sobre o que via eram depois transcritos por Filipe Melo para um blogue [as crónicas acabaram no livro O Senhor do Adeus - Tertúlia Semanal de Cinema, da atelier ESCRIT´ORIO editora].

O último foi A Rede Social. De que desconheceu a existência durante muito tempo, mas de que fazia parte para sua admiração e satisfação.

Morreu aos 79 anos. A 11 de Novembro de 2010. Talvez não reconheça o nome. Mas garanto-lhe que nesse dia ficámos todos mais sozinhos.

   Consta que «nunca trabalhou, mas conhece a Europa toda», chegou a comentar-se. Diz-se sempre muita coisa. Um menino rico. Filho de gente abastada. Nunca trabalhou, nem entrou numa cozinha. Assumia.

   O que me lembro, especialmente, dele era que salvava pessoas. Não era médico, não retirava vítimas de prédios em chamas, nem enfrentava batalhas sangrentas para libertar povos oprimidos. Ou outra profissão onde isso aconteça garantidamente. Mas era disso que se ocupava.

Chamavam-lhe o Senhor do Adeus. E salvava gente. Defendia-nos. Com um adeus. Por cada adeus poupava uma vida. Era quanto bastava. Mais o seu coração. E sangue. Um adeus uma vida salva, um adeus uma vida salva…

   JMS passou parte da sua vida a salvar pessoas.

   Desconhecem-se médias e taxa de sucesso. Não há testemunhos. Ou perto disso. E os registos são esconsos e circunstanciais. Mas fazia-o à vista de toda a agente.

   JMS salvava pessoas. De si mesmos. Da indiferença. Isolamento. Dos outros.

No Saldanha, Restelo ou na Rua da Escola Politécnica. Era do conhecimento geral. Se calhar estou a falar para quem também foi salvo por ele. Ou dispõe de informações sobre salvamentos. Cheguei a assistir. E eu próprio fui salvo por si.

Isto porque a solidão para além de torturar mata sem misericórdia. Lentamente.

A solidão só é boa quando parte de nós. Voluntária. Um tempo que é nosso. O silêncio. O pior é a outra. Traiçoeira. Que se instala. Parasita. Tem custos de: «soubesse eu o que sei hoje». Para essa pouco ou nenhum remédio se conhece. E é por isso que quando surge alguém capaz de ajudar a dar cabo dela o seu contributo é fabuloso.

Cada adeus de João Serra servia para a enxotar. Para a mandar para longe. O máximo que conseguisse. Era um «vai à tua vida». Um «deixa-nos em paz».

É por isso que não tenho dúvidas de que quando João Manuel Serra cumprimentava quem passava estava em missão de salvamento. Nem mais, nem menos. Milhares de pessoas foram salvas por JMS. Sempre que passavam por si. Primeiro salvou-se a si. Escapando-lhe. «Essa senhora [a solidão] é uma malvada, que me persegue por entre as paredes vazias de casa. Para lhe escapar, venho para aqui [o Saldanha]», explicava.

Mas depois dedicou a sua vida a salvar os outros. Desconhecidos. A partir da meia-noite. Acenando. Em certo sentido era um herói. Os carros apitando-lhe de volta. Triste quando o movimento acabava.

   JMS salvava-nos de estarmos sozinhos. Que é bom mas aos bocadinhos. Sabe bem mas em doses pequenas. Voltados para nós. Podendo dizer basta. Abrir a porta e chamar: «agora já podem entrar todos». Um claustro com largueza dentro de uma casa recheada de convidados. Um sal que faltando insonsa mas quando largado solto da mão salga em exagero.

   A gente sabe que até consegue sentir-se só rodeados de uma multidão numerosa. Mas, embora nos apeteça dispensá-la [sim, para estarmos sozinhos], gostamos de a ter sempre à mão. Por perto. Ninguém se importa de ser solitário quando tem disponível uma multidão.

   No dia em que JMS desapareceu as vítimas foram incontáveis. E continuam até hoje. Até que apareça alguém que ocupe o seu lugar. O que ainda não sucedeu. Nem se conhece ninguém capaz de o fazer. Talvez JMS fosse insubstituível. Às vezes isso acontece.

As vítimas vão-se sucedendo. 

   Dou-me bem com a solidão. Mas não muito. Temos uma relação de respeito mútuo. Eu sei que às vezes preciso dela e ela compreende que não podemos passar muito tempo juntos. Que quando isso acontece as coisas tendem a azedar.

Talvez por isso, sempre que passo na Praça Duque de Saldanha procuro JMS. Especialmente em dias em que também preciso de ser salvo. Era bom termos alguém pronto a salvar-nos. No sítio habitual. Como quem não vai a lado nenhum. Sempre disponível.

João Manuel Serra já não está lá. Mas há gente que continua a precisar de ser salva.  

Olho sempre várias vezes na esperança de o ver reaparecer.

Mas sei que o pior no adeus é a partida. Um adeus tem fim à vista.

Talvez por isso ele dissesse que era o senhor do olá.

Hoje é domingo e era dia de ele ir ao cinema.

Até sempre!, como ele costumava dizer.

 

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publicado por Carlos M. J. Alves às 14:12

III Vitória, vitória, não se acabou a história!

Sexta-feira, 22.06.12

Após darmos água pela barba aos checos [parece que havia a vontade de não a cortarem tão cedo, pelo menos enquanto andassem em competição, oops], um golo de Ronaldo, aos 79 minutos, bastou para pôr Portugal nas meias-finais do Euro 2012.

   Por mim a hora é de aplausos. O feito colocou-nos entre as quatro melhores selecções europeias. Os erros, esses, são para aprender.

   Embora o futebol também viva de momentos, em equipa que vence não se mexe. A não ser que seja para chegar à final do Euro 2012. Aí não só aceito como troco pelo mais vantajoso.

   Já perdemos o que tínhamos a perder. Continuamos em frente.

Para a frente é que é a final.

Não se arranja uma cunha para conseguir vidas suplementares?

Por mim ganhamos. Salvo melhor opinião [Platini?].

   Em relação ao próximo jogo devíamos M2$%%&1%7(&&§0Ø∑£#'9. E se não resultasse, no final da primeira parte ou, ainda, a meio talvez fosse melhor Ø∑£#'9Q“#&§$&/. Ou 7W(&&§0w§b$&/%$4567

Penso que seria uma boa táctica. Em alternativa como plano B talvez %$/%&%(&/EQ!'«L.

Essa é, pelo menos, a minha opinião.

De qualquer maneira o segredo é a alma do negócio.

E isso é uma verdade válida até para o futebol.

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publicado por Carlos M. J. Alves às 10:37

III A idade não conta só para os aniversários

Quinta-feira, 21.06.12

A idade é mimada. Não se deixa contrariar. Nunca conseguimos estar de acordo com ela. Aquém ou além de si. Mas não é um pró-forma. Faz parte do nosso dia-a-dia: «sinto-me bem com a minha idade», «ando farto da minha idade», «não pareces ter a idade que tens», «estás óptima para a tua idade», «isso não tem que ver com a idade», dizemos.

Obriga-nos a esforçarmo-nos por ela. É de difícil convívio. Exige habituação. Resignação. Paciência. Cedência no número de prateleiras e no lado da cama.

   Também não é voluntária. Se fosse por nós, não tinha amigos. Ninguém a queria. Passávamos ao lado. Contornando-a. Pelo menos a maioria. E o remanescente mais por exigências do politicamente correcto.

   Por questões de respeito democrático devia de existir a fila para a meia-idade. Para a adolescência. Infância, etc. Com a derradeira hipótese de cortar a direito.

   A idade é uma gruta de Ali Babá onde se escondem as memórias dos tempos do ié-ié, da queda do muro ou adesão à CEE. Riscar o que não interessa.

Está mesmo ali ao lado. O sítio onde amontoamos o nosso passado e em relação a este, relembrando L.P. Hartley em The Go Beteween: The past is a foreign country: they do things differently there.

O que faz com que a idade também nos dê alegrias, se nos esforçarmos:

M. a aprender a Estrelinha no violino. Todos nós concentrados. Sem nos importarmos. Dedos em procura lenta. Arco passando de mão em mão. C. perguntando entre trejeitos: «Esta cara tem graça?». Rindo. Como nós. E a nossa história de amor. Onde tudo começou. Um Era uma vez pessoal.

Lamechas? Uma pieguice pegada? Provavelmente. Mas só se pede desculpa pelas coisas que lamentamos.

   Na maioria dos dias não se vê bem para que é que precisamos da idade. Não traz vantagens evidentes.

E se traz não compensa as responsabilidades. Só nos faz mais velhos.

A minha não é diferente. Bem podia ser para os outros. Até porque há gente para tudo. Deve haver por aí quem goste dela, mas…

Hoje, no entanto, acabei de nascer. Há serpentinas e balões pelo ar comemorando o meu nascimento antigo. Tchim-tchim. Hoje ela não conta. Nos outros dias a idade é por nossa conta e risco. Anátema habitual. Mas não hoje. Isso não se aplica ao dia em que fazemos anos. Tchim-tchim.

   Alturas houve em que a idade nos faltava. Para assistir à sessão nos cinemas Alfa. Depois acabou a sobrar. De nós. Quando achávamos que já estávamos servidos, ela continuou: até hoje. Dia de aniversário. Num regabofe despropositado. Como uma visita indesejada que impõe a sua presença e que não sabe quando abandonar a festa.

   Nos outros dias tentamos viver com ela. Dizemos vintes, trintas, trintinhas, em vez do que, realmente, é. Mas ela tem coisas de que não lembra a ninguém. É uma chata. Vem connosco à pendura. Ou pior: um passageiro clandestino.

É um tropeço. Inadmissível.

   Às vezes assume-se como inconsciência, peso, desperdício, infantilidade, segredo. Pode ser variadíssimas coisas. Embora tenha aspecto de que só dá prejuízo. Podemos tentar, mas ela não se deixa enganar. Mais valia deixar-nos. Cada um indo à sua vida.

Mas ela não nos larga o pé. Um incómodo. Acarreta mal-estares, irritação, doenças e eczemas. E outras coisas próprias… da idade!

   Por justiça, se pensarmos bem, tem mais a ver com o que se faz com ela. Afinal, a idade também dá muitas alegrias. Sei que já o disse! Mas nunca é demais repeti-lo. Para os néscios. Ou os mal-agradecidos.

   Dito isto vou fazer alguma coisa com ela. Já oiço uns dedos tímidos num violino, hesitando no Lá, a precisar de ajuda. E vejo uma cara engraçada.

   Tchim-tchim. Um brinde à minha idade. Hoje é um bom dia para pensar nela. Não vivemos de costas voltadas eu e ela. Somos bons vizinhos. Tenho muito boas razões para estar satisfeito.

   Parabéns a nós!

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publicado por Carlos M. J. Alves às 11:36

III Auf wiedersehen fase de grupos, olá quartos-de-final, até já meias-finais

Segunda-feira, 18.06.12

São tantos os males que já tenho suportado, tantos os trabalhos, no mar e na guerra! Venha mais este a juntar-se àqueles!

Homero, Odisseia

 

 

Portugal venceu a Holanda, num jogo arbitrado pelo italiano Nicola Rizzoli em Kharkiv, a segunda maior cidade ucraniana com 1,5 milhões de habitantes.

Apesar do resultado forreta de 2-1 Portugal, com dois golos de Ronaldo, chega aos quartos-de-final do Campeonato da Europa.

O primeiro objectivo está atingido.

CR7 (de ausente a homem do jogo) & Co, apesar da percentagem menor (42%) de posse de bola em relação aos holandeses (58%), carimbaram o acesso aos quartos-de-final após vinte e dois remates à baliza de Stekelenburg, alguns falhanços de Nani e Postiga e bolas no poste.

Objectivo cumprido.

   No animado quadro sobrenatural, no que diz respeito à confraria de ocultistas premonitórios constituída por polvos, porcos e afins, destaca-se agora Quinas, o crocodilo.

O resultado confirma, aliás, a aposta ganha em Quinas, um crocodilo moçambicano da cidade da Beira que garantiu a vitória lusa, pouco impressionado com a falsa partida portuguesa contra a Alemanha.

Nem porco, nem polvo, portanto…

Ganhando em potencial lagareiro, o que deixou escapar em possibilidades de adivinhação, para trás ficou o polvo Paulo.

Apesar de ter acertado no resultado contra Alemanha, que no confronto com a Dinamarca não se poupou a esforços para garantir a vitória frente aos escandinavos.

No entanto, uma palavra de apreço para si, pois enquanto tag da Máquina da Preguiça aparece, largamente, à frente, por exemplo, de Homero no que às visualizações diz respeito.

   De um ponto de vista meramente gastronómico, para aumentar o apetite para o que aí vem, podemos dizer que os quartos-de-final exigiram espremer a laranja, mas as meias-finais implicam dar conta de porco assado, com couve e bolinhos.

   Depois da Holanda venha a República Checa.

   Até já, meias-finais.

   A Odisseia continua.

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publicado por Carlos M. J. Alves às 09:59

III Carta a Miguel Esteves Cardoso

Domingo, 17.06.12

Caro Miguel Esteves Cardoso (MEC)

 

Sem querer fugir ao assunto, começo por dizer que não o conhecer pessoalmente é um caso de manifesta injustiça.

Tenho livros seus lidos em quantidade suficiente para o merecer. Conhecimento de crónicas bastante para isso já ter sucedido.

Horas de Noite da Má-Lingua. Visitas ao Pastilhas.

Fui assíduo na leitura d' O Independente e fiel comprador da revista K. Consulto com frequência Em Portugal não se come mal e Com os Copos. Prefiro as suas traduções das peças de Samuel Beckett.

Por causa da sua letra ainda ouço Foram Cardos Foram Prosas (com música de Ricardo Camacho, interpretada por Manuela Moura Guedes).

O que concede ainda mais força à ideia de injustiça. Penso que pelo menos um gin tónico consigo já se justifica há anos.

   Posso ser acusado de exagero, de ser tudo demasiado aparatoso. Mas em relação a certas coisas, tenho mau perder. E não concordo, em absoluto, com certos privilégios.

   Se a memória não me falha, também nunca nos cruzámos. À excepção de uma vez nas Amoreiras. Que eu me recorde! Penso que confirmará.

Nunca fomos além de um «com licença». Mas  é possível simpatizar com alguém sem nunca o ter conhecido, verdadeiramente. Concordar com as suas ideias só por as ter lido num jornal. À primeira. Dispensar troco. Achar que sim senhor. Querer tudo de bom para si, só porque sim. É o que sucede no meu caso. No nosso…

Essa é, pelo menos, a minha opinião. Podemos construir um mundo inteiro baseado em suposições e ele funcionar. Ou, pelo menos, termos essa sensação. Mesmo que tudo não passe de uma ilusão. As certezas estão sobrevalorizadas.

   Sei que tem passado um mau bocado. A razão é do conhecimento geral. Não são precisas mais explicações.

Que tem sofrido. E eu tenho sofrido junto. Menos, como é óbvio. Por simpatia. Por ter a sensação de que nos conhecemos desde sempre. Sem nunca nos termos cruzado. Por pensar que lhe estou a dever. Por achar que consigo sentir, também.

   Foi graças a si que achei que também conseguiria escrever. Penso até que tem uma geração inteira (pelo menos) que o responsabiliza pelo mesmo.

Por sua causa deixei de ter tento na língua. Senhor do meu nariz. Passei a não comer e calar. Aprendi que ninguém merece ser, antecipadamente, levado em ombros. A escrever sobre isso. Como se fosse uma emergência. Foi a altura em que, provavelmente, mais me cresceu pelo na venta.

Acabei a ler nas entrelinhas. Mais desinibido nos temas. Desenvolto na gramática. Atento à sintaxe. Escrever parecia fácil. Por sua causa parecia uma coisa simples. Depois percebi que não e levei isso um bocado a peito. Como se tivesse invadido uma festa para a qual não fui convidado. Temi não ter entrado com o pé direito. Ser fruto de um erro de casting.

Já lá vão uns anos.

Senti-me traído. Capaz de vazar os próprios olhos. Não se ilude assim as pessoas. Só porque somos bons. Deve-se explicar que não é para todos. Que não funciona assim. Durante muito tempo acusei a quebra do voto de confiança.

   Demorei algum tempo a perdoar-lhe, mas aprendi consigo uma coisa ou outra sobre o amor e, embora tenha resistido, isso acabou por acontecer. Que é fodido. Para começar. E isso compensou tudo o resto. A desilusão anterior. Afinal, fui eu que me pus a jeito. Como costuma dizer: «a culpa é sempre nossa.» E talvez o segredo seja mesmo a alma do negócio.

   Mais recentemente, enquanto sofria consigo, percebi pelas suas palavras que amar nunca deixa de ser fodido. Por esta ou aquela razão. Já desconfiava. Mas há sempre uma lição ou outra a tirar. A aproveitar dos outros. De si.

   Coragem MEC, sem a sua ajuda nunca teria conseguido escrever esta carta.

   Obrigada por tudo. 

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publicado por Carlos M. J. Alves às 10:00


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