Máquina da Preguiça®
O texto é uma máquina preguiçosa [Umberto Eco]
III Bué da phixe
Em relação ao calão melhores dias virão para mim, certamente. Sou sintaticamente esforçado e empenhado ao nível dos sintagmas mas, a verdade é que ando linguisticamente descompensado. Prejudicado, descaradamente, pela semântica. Em constante anacronismo proverbial.
Encalhei.
Ainda me falta tomar a Bastilha linguística de assalto. Continuo agarrado ao "ph". Desconfiado com "bacanos, "maganos" e "meus".
O meu calão anda desfasado. Caio com os bofes de fora aos primeiros metros no caminho da actualização. O meu coração não aguenta, porque a minha modernidade é antiga. Vitoriana.
Vivo no antigamente e não tenho grupo certo.
Tenho paleio de antigamente, português de terceira idade. Ando a cair da tripeça no calão.
Falta-me "Swag".
Tenho uma evolução lenta em relação à gíria. Escapam-me décadas inteiras.
Sou do tempo do cinema mudo e sendo optimista, durante algum tempo, da época do preto e branco.
Falho no contexto, sentido de oportunidade e troco significados.
Dou de "frosques", em vez de "dar de fuga" e vou-me embora em vez de “bazar”.
Finjo ser “Fixe", mas denuncio-me porque gosto muito em vez de “bué” e prefiro um bocado quando se pedia uma “beca”.
Conforme as épocas deixo de saber conjugar e erro nos graus.
Em relação ao calão vacilo. Improviso, logo baralho.
Sou inexpressivo por falta de vocabulário. Acabam-se-me rapidamente as palavras e desactualizo-me com facilidade. Falho nos tempos, acordos, assimilações, incorporações, e nos "ismos". Confundo-me.
Acabo a desculpar-me, embasbacado.
Fico apeado.
Sou desadequado. Antiquado.
Calão?
“Népia!”
Apesar de tudo tomo notas, atento a expressões e complementos. Treino e aplico-me.
Já sinto algumas melhorias.
Incómodos à parte tenho recuperado de anos de atraso. Derrapo menos e já não tropeço no trocadilho. Já faço “cagaçal” em vez de barulho.
Acredito que estou no caminho certo em relação ao calão.
Ainda me falha a memória e a dicção, mas já arranho.
"Tásse".
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III A minha pátria pode um dia não ser a língua portuguesa
Adivinhe se for capaz. Aceita o desafio? Então lá vai...
Qual é coisa qual é ela que o Presidente [o da República] deixou transparecer, na Feira do Livro de Díli, que tem dificuldade em usar, mantendo em casa o que aprendeu na escola?
Em relação ao qual, a maioria está em desacordo. Os especialistas, uns não veêm necessidade e outros têm ideias próprias [e diferentes] sobre o assunto. Os países não implementam. Os escritores não utilizam. Os críticos não levam a sério. Os comentadores desaconselham. Os jornalistas usam o antigo [por aqui também, ainda, se faz o mesmo]. Os ganhos não são evidentes. As vantagens passam despercebidas. Sobre que se diz que certa unificação apregoada não passa de uma ilusão.
Tendo regras, excepções (muitas), duplas grafias e acentuações, supressões de acentos gráficos implicando, também, com a hifenização e o uso de maiúsculas e minúsculas?
Por via de quem “semi-recta” passa a “semirreta”, “bóia” fica a ser “boia”, “Egito” deixa de ser “Egipto”, “excepcional” já é só “excecional”, “Verão” baixou a “verão”, ao “adjectivo” basta ser “adjetivo”, o mesmo se passando com a anterior “perspectiva” que se fica por “perspetiva”?
Já conseguiu? Ou precisa de mais pistas?
Sim, trata-se do acordo ortográfico. Não vale a pena chorar pelo antigamente. Já adoptou? Perdão… adotou?
Dificuldades?
Vá, então esse optimismo?
Raios! Otimismo.