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III Quatro anos de furacão Catarina

Sexta-feira, 26.04.13

Como sobreviver a um furacão? Bem, não sei em relação aos outros, mas no que diz respeito à minha filha mais nova enfrenta-se fazendo gugu-gaga, com colinho e cantarolando os maiores êxitos das melodias infantis. A princípio, pelo menos. Nos dois primeiros anos. À base de canal Baby Panda. Depois passando a Disney Channel Nickelodeon. Que é como quem diz: Noddy, Ruca, Os mundos de Mia, até chegar a O meu cão tem um blog.

  Ao contrário dos furacões normais não existem lugares mais abrigados nem medidas de salvação perfeitas. A sobrevivência exige fraldas secas e papa a tempo e horas, nervos de aço e capacidade de aguentar meses sem dormir.

   Cá em casa o nosso furacão tem quatro anos. Um cataclismo gostoso que faz hoje anos. Uma intempérie com tanto de chorona como de bem-disposta. Sem momentos acentuados de calmaria. Nem mesmo quando tudo era atingido gatinhando ou sob a companhia auspiciosa de barbies e da sereia Ariel. Levando centrifugamente mesas, cadeiras, legos e  palmeiras pelos ares.

Nós habituando-nos, o melhor que conseguimos, às constantes mudanças atmosféricas e aos remoinhos agitados de mau feitio. 

   Temos escapado à justa. Um furacão é sempre um furacão! 

Mas, também, não merece a pena fazer uma tempestade num copo de água.

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publicado por Carlos M. J. Alves às 14:12

III O Silêncio dos Inocentes

Domingo, 17.02.13

Em casa o silêncio é tão difícil como ganhar a lotaria. Tão improvável como uma descida súbita de impostos.

   A paternidade traz associada a falta de sossego. Ventos intranquilos para a bonança. Um desnorte para a paz e serenidade.

  A ingenuidade infantil é um antídoto para a tranquilidade, uma vacina para a mudez, uma antecâmara para o barulho.

  Uma criança tem a capacidade de apreciar tudo o que seja elemento decorativo inspirado num universo Austin Powers e de possuir um débito sonoro (ruidoso) equivalente a uma actuação de uma banda de Death Metal em noite de  prémiere. Dentro e fora de portas. Fazendo um aproveitamento aparatoso para espectáculos da sala de jantar, equivalente ao possível na Wembley Arena e Coliseu dos Recreios ou na varanda por comparação com os jardins de Versailles.

Entidades implacáveis, armadas até aos dentes de cordas vocais aguçadas e poderosíssimas aptas a lançar semicolcheias selváticas e riffs ásperos à base de atmosferas guturais e histéricas a vários quilómetros de distância à velocidade da luz. Defendendo a máxima "para quê sussurrar quando se pode gritar" entusiasmadas como se apregoassem a paz para o médio oriente até três galáxias de distância da nossa. 

Groupies  endiabradas sub 8, autoras de autênticos hinos pedregosos, entoando a mensagem "Aqui não haverá silêncio!" e sinfonias guinchadas "Aqui ninguém ouve nada!". 

    Em qualquer lado que existirem crianças nas proximidades tudo será, inevitavelmente, gritado a plenos pulmões. 

    Não quero aparentar ter um apetite torturador por criaturas barulhentas como McCarthy por comunistas mas, multipliquem o descrito por duas crianças e percebem a impossibilidade de ter um ambiente silencioso. 

Às vezes, tem-se a sensação de ter embarcado numa cápsula do tempo e aterrado em plena beatlemania com ninfetas entre os 3 e os 7 anos vozeando esbaforidas sem ser necessário ouvir Love me do. Os ouvidos de vítimas inocentes acabando saqueados e consumidos como patê, os miolos desfeitos em Strogonoff suscitando uma dieta rápida e fulminante de decibéis.

Nessas alturas olhamos em volta desesperados e pedindo auxílio. Como quando estamos no avião a olhar pela janela, com o rabo com a forma de um hexágono recente, e observamos, atentamente, as nuvens na esperança, estranha e impossível, de aparecer uma placa a dizer Nova Iorque a 500 metros.

     Ora, ninguém sai prejudicado se for um fã da Dave Matthews Band ou um seguidor atento dos comentários maternais e eroticizados de Teresa Guilherme “O que a menina quer sei eu!” que se podem ouvir entre zappings. Mas a situação torna improvável apreciar, atentamente, um acorde de Glenn Gould ou uma reflexão de George Steiner.

Desferindo o golpe final, como uma anjo da morte sem misericórdia, à filosofia de vida que tem inerente a ideia de que There’s no place like home.

     É claro que acabamos a relativizar e a repensar a possibilidade de viver com mini cyborgs providos com uma espécie de didgeridoo infernal em vez de língua. Protela-se a opção "Chamem a polícia". Até porque a  nossa consciência nos acaba por lembrar que são crianças… inofensivas e cândidas. E mais importante que isso, que são nossas. 

E isso muda tudo. Infelizmente, o barulho continua.

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publicado por Carlos M. J. Alves às 11:54





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